Transformação além do digital

“Cultura organizacional para mim é o jeito que as coisas são feitas por aqui.” É dessa forma que Alejandra Nadruz, diretora de Gente e Cultura da Softplan, descreve esse conceito, que vem sendo cada vez mais abordado no mundo corporativo. 

Um dos fatores para que o assunto esteja mais em voga são os avanços trazidos pela transformação digital, fazendo com que ganhe novos contornos no decorrer dos últimos anos. Inclusive, também nas palavras de Alejandra, “se a gente partir da premissa de que a tecnologia não é o fim, mas sim o meio para facilitar a vida das pessoas”, teremos culturas organizacionais cada vez mais inclusivas nas próximas décadas.

Porém, “precisamos pensar na cultura organizacional não como algo abstrato ou imaterial mas, sim, como um conceito pragmático e plenamente aplicável no dia a dia das empresas”, reforça a diretora.

Nesta reportagem, Alejandra Nadruz nos explica como encarar esse desafio e quais os impactos positivos da transformação digital na cultura das empresas. Continue a leitura e entenda porque as instituições que investem em desenvolver este conceito faturam mais.

Por que as empresas que investem em cultura organizacional têm melhores resultados?

Uma pesquisa realizada pela Boston Consulting Group (BCG) mostrou que o desempenho financeiro das empresas que priorizam a cultura organizacional, no contexto da transformação digital, foi cinco vezes maior do que aquelas que não focaram nesse tema.

Por outro lado, um levantamento realizado pela Futuro S/A (consultoria em transformação cultural, ações e atuação de RH), com 222 profissionais, apontou que 65% dos entrevistados acreditam que ainda há muita inconsistência entre o que é falado e o que é realmente praticado na empresa quando o assunto é cultura.

Essa incongruência pode ser ilustrada por um terceiro estudo, realizado pelo Instituto Gallup em 2022. O levantamento, feito com 800 trabalhadores norte-americanos, aponta que um dos principais motivos pelos quais as pessoas se desligam das empresas é justamente o fato de não terem “fit” cultural com a instituição.

“Segundo o estudo do Gallup, essas pessoas estão pedindo demissão por três grandes causas: ‘tenho conflitos com a liderança’‘(não suporto meu chefe), ‘não tenho autonomia na minha função’ ou ‘não me adapto à cultura organizacional’”, explicou Alejandra.

Ainda conforme ela, esse movimento – que ficou globalmente conhecido como “Grande Renúncia” e que afeta significativamente o Brasil – mostra que os pedidos de demissão voluntária vêm trazendo prejuízos financeiros bilionários para as empresas.

Uma maneira eficaz para uma empresa estar blindada diante desse desafio é investir em uma cultura mais diversa e horizontal. Alejandra pressupõe, então, alguns impactos positivos de curto, médio e longo prazo para as empresas que investem nesse aspecto: 

Maior retenção dos colaboradores

A mudança de cultura nas empresas reduz o turnover e aumenta a retenção dos colaboradores. Para se ter uma ideia dos efeitos da “Grande Renúncia” no Brasil, em 2022, quase sete milhões de brasileiros pediram demissão de forma voluntária.  

Isso equivale a toda a população do estado do Maranhão e corresponde a um terço do total de desligamentos contabilizados no país. Os dados são do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), compilados pela LCA Consultores.

Uma das conclusões da pesquisa é que, embora haja muitos “Brasis” no mundo do trabalho formal, a mão de obra pouco qualificada compõe a maioria desses cenários. Nesse sentido, as pessoas que têm um grau a mais de qualificação acabam adquirindo esse “poder de barganha” ao se demitirem voluntariamente.

Times mais ágeis e produtivos

Empresas que investem em cultura organizacional conseguem ter times mais alinhados às metodologias ágeis, o que é essencial para a satisfação do colaborador e também para a produtividade das equipes.

Na visão de Alejandra, modelos ágeis de trabalho também estão no cerne da relação entre cultura e transformação digital nas empresas, uma vez que a tecnologia permite o desempenho das funções com mais eficiência.

Para embasar seu raciocínio, ela cita o livro “Organização dirigida por valores”, do autor britânico Richard Barrett. A obra, que relaciona cultura ao engajamento,  descreve com detalhes por que as pessoas mais engajadas são aquelas que trazem mais resultado.

Equipes engajadas, motivadas e satisfeitas 

Falando em engajamento, o relatório anual do Instituto Gallup (2022) mostra que, em um universo de cerca de 160 mil trabalhadores, apenas 23% deles se sentem de fato engajados com a empresa onde trabalham. A principal razão evidenciada na pesquisa para isso é a incompatibilidade do colaborador com a cultura corporativa.

Ainda segundo o relatório, 60% dos trabalhadores estão atuando no modo “Quiet Quitting”, numa perspectiva que poderia ser traduzida livremente como a “lei do menor esforço”. Ou seja, profissionais desengajados estão fazendo o mínimo esforço possível para se manterem no emprego enquanto não conseguem uma oportunidade melhor.

Cultura organizacional e Cultura de inovação: qual a relação?

Por mais que a instituição tenha uma cultura organizacional bem estabelecida, se não houver incentivo à autonomia e abertura de espaço para prática inovadoras, o clima organizacional pode ser afetado, assim como os resultados. 

Sobre essa relação, Alejandra traz um questionamento importante: “O que entendemos por inovação? Falar em inovação disruptiva é muito difícil. Não é todo mundo que consegue mandar um foguete pra lua.” Com essa ponderação, ela sinaliza que deveríamos falar em inovação como iniciativa, percurso e uma “melhora no modo de se fazer as coisas”.

Na visão da diretora de talentos, a inovação tem sido muito romantizada, especialmente nesse sentido disruptivo. “São pouquíssimas as empresas que fazem inovação disruptiva. Por isso, o ideal seria pensarmos a partir de uma visão mais realista: De que modo podemos inovar hoje? O que temos de oportunidade dentro do nosso próprio trabalho? Aí sim teríamos uma cultura de inovação mais aplicável”, pondera.

E o que é preciso para alinhar transformação digital e cultura das empresas? 

Não resta dúvida de que a transformação digital impacta na cultura das empresas. Mas Alejandra Nadruz nos lembra que esses impactos só serão positivos se alguns aspectos forem priorizados. Caso contrário, as novas tecnologias não serão exploradas em todas as suas potencialidades.

Se a estrutura se mantém hierárquica, os avanços digitais permanecem restritos ao alto escalão das empresas. A configuração de culturas mais horizontais, portanto, se torna pré-requisito para alinhar transformação digital com a cultura organizacional.

“Antes de pensar nas novas tecnologias como suporte ao nosso trabalho, precisamos empoderar os colaboradores para que eles se sintam encorajados a dialogar com os líderes. Do mesmo modo, precisamos criar lideranças dispostas a ouvir”, afirma Alejandra.

Ainda na perspectiva da diretora, toda inovação carece de diálogo e de portas abertas. Nesse sentido, não há como implementar uma cultura de transformação digital se a comunicação na empresa é verticalizada.

Outro ponto decisivo nessa relação é a diversidade. É importante ter pessoas com histórias diferentes criando juntas. E quando se fala em diversidade, não é apenas  demográfica, mas, sobretudo, cognitiva.

Inclusive, um dos impasses no alinhamento entre transformação digital e cultura nas empresas é que, muitas vezes, essa diversidade ocorre só no plano teórico. Isto é, a empresa prega um discurso de inclusão mas, na prática, continua reproduzindo o mesmo padrão hierárquico das estruturas tradicionais. Sendo assim, é preciso haver consistência cultural, fazendo com  que os discursos se traduzam na prática.

Cultura da transformação digital na Softplan

Ainda sobre a temática da diversidade nas empresas, Alejandra faz questão de reforçar que a tecnologia é uma ferramenta poderosíssima de inclusão: “Sem o suporte tecnológico, muitas pessoas teriam um grau de dificuldade muito maior para desempenharem suas funções nas empresas”.

Ela ilustra esse raciocínio citando o Movimento Transforma, da Softplan. “O ‘Transforma’ baseia-se em alguns pilares que consideramos essenciais. Quando lançamos esse Modelo de Gestão de Pessoas, inserimos a iniciativa da diversidade e inclusão dentro do pilar ‘evolução’, pois a mensagem que queríamos passar é que só vamos evoluir se trabalharmos com pessoas diversas”, comenta.

Fortalecendo a cultura organizacional na prática

Para além da Softplan, a diretora de talentos cita outras iniciativas das quais tomou a frente para fortalecer a cultura organizacional na prática corporativa. Foi guiada pelo que ela chama de “consistência cultural” que ela tirou do papel projetos importantíssimos para a implementação da transformação digital nas empresas.

“A tecnologia impacta na vida das pessoas. E isso consequentemente muda a atuação dessas pessoas”, explica a diretora. Em sua performance como gestora de cultura, ela relembra a digitalização de pontos de atendimento em lojas de grandes marcas, o que ajudou a democratizar o acesso ao conhecimento para os clientes e usuários daquelas soluções.

Situação semelhante ocorreu na digitalização de pontos de atendimento em agências bancárias, numa iniciativa também orientada por Alejandra na intenção de agregar valor à experiência do cliente no ambiente físico. 

É também por isso que ela questiona a conceituação genérica do que se entende por transformação digital: “Parece que esse termo é uma sacola em que se cabe tudo”. Mas, a partir do momento em que se percebe que a transformação digital é sobre usar a tecnologia como meio e não como fim, aí sim podemos falar que houve transformação de fato, ou seja, que a tecnologia facilitou o dia a dia dos colaboradores.”

Colocar as pessoas no centro é a ponte entre tecnologia e cultura organizacional

Muito se debate sobre os impactos da implementação massiva das novas tecnologias nas empresas. Se aparatos de inteligência artificial passam a conduzir digitalmente toda a lógica de produção, o que vai acontecer com as posições de base dentro das empresas? “Se automatizarmos tudo, o que faremos com os estagiários, assistentes e demais posições de nível operacional?”, questiona Alejandra.

Longe de se sentir ameaçada por esse contexto, ela própria aponta um caminho: “A mudança cultural nas empresas começa pelas pessoas”. Para ela, esse é o grande desafio dos setores de RH atualmente, “mas não só nos dias de hoje”, pondera.

“Priorizar a cultura organizacional nas empresas é um desafio histórico. Quando passamos a entender a cultura como algo central, compreendemos que as pessoas também são centrais. Logo, precisamos criar soluções a partir das pessoas, e não apesar das pessoas”, reforça.

Nesse âmbito, não basta uma empresa dizer que seu RH é estratégico se isso não impactar no cotidiano da empresa. Mais uma vez, estamos diante do conceito da “consistência cultural”, isto é, do alinhamento entre teoria e prática que as instituições precisam cultivar.

Afinal, a única estratégia possível é a que traz resultado. E esses resultados passam necessariamente pelo cultivo de uma cultura mais diversa e inclusiva dentro das empresas.

Sobre Alejandra Nadruz

Apaixonada por gente. É assim que a diretora de Gente e Cultura da Softplan, Alejandra Nadruz, se define em seus mais de vinte anos de carreira como professora, mentora e consultora de pessoas e empresas que buscam um mundo melhor e mais justo.

Ao longo desse percurso, Nadruz liderou uma série de projetos relacionados à cultura organizacional em grandes empresas, envolvendo design de cultura, educação, experiência dos colaboradores, comunicação interna, storytelling, proposta de valor de marca e produtos, marketing digital/conteúdo e alguns mais.

Desde janeiro de 2023 está à frente do time de Gente e Cultura da Softplan. Alejandra Nadruz também lidera outros projetos multidisciplinares e palestra em eventos que ajudam as pessoas a se conectarem por meio de histórias e experiências transformadoras.

Alejandra Nadruz

Alejandra Nadruz

Nascida no Uruguai, mora no Brasil desde 2010 e, ao longo de sua trajetória, passou por diferentes empresas e cargos, como Gerente de Recursos Humanos, Head de Pessoas, Cultura e Marketing. Sua formação acadêmica é de Bacharel em Direito pela Universidade da República de Montevidéu, no Uruguai, além de MBA Executivo em Recursos Humanos, pela Universidade ORT. É também Bacharel em Pedagogia e possui Mestrado em Direção Estratégica de Empresas pela Universidade de León, na Espanha. Alejandra é uma apaixonada por gente: professora, mentora, consultora de pessoas e empresas que buscam e querem um mundo melhor e mais justo. Atualmente, está como Diretora de Gente & Cultura do grupo Softplan e tem como foco a estruturação das equipes, crescimento dos negócios e escalabilidade no mercado.

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